segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Temer e a conciliação das máfias

Por Mino Carta, na revista CartaCapital:

Com o seu tradicional alheamento, o Brasil assiste ao enésimo capítulo da chamada conciliação das elites. A palavra elite soa-me inadequada, por presumir, entre outras, qualidades intelectuais, primazia cultural, saber. No caso, aludo à conciliação das máfias que mandam neste país infeliz, cada vez mais insignificante e tragicamente ridículo.

Honra a quantos votaram “não” na noite de 2 de agosto, mas o espetáculo oferecido pela Câmara de Brasília com os sorrisos da apresentadora da Globo é altamente representativo das penosas condições em que o Brasil precipita.

Anoto com prazer, e até com um certo orgulho, que Lula nos últimos tempos tem-se referido à casa-grande ao lhe pronunciar o nome com todas as letras. Daí a conclusão: o ex-presidente entendeu de vez que com os barões não há acordo. Não faltam petistas, entretanto, que ainda acreditam em conciliação e que Temer serve para nos conduzir até as eleições de 2018.

O propósito de conciliar dá-se em torno de Michel Temer, o presidente ilegítimo e corrupto agarrado à sua poltrona. Qual é o país do mundo democrático e civilizado em que, nas mesmas circunstâncias, o presidente pego com as mãos na massa continuaria a postos? Sabemos não haver. O Brasil, contudo, é único e inconfundível.

Em relação a Temer, os mafiosos disfarçados de aristocratas digladiam-se desde o momento em que seus pecados se tornaram domínio público. A Globo emitiu seu veredicto: renúncia. FHC, voz da sabedoria tucana, não deixou por menos. Faz pouco mais de uma semana, a saída de Temer parecia irrevogável. Nada disso, ele fica.

Espalha-se a convicção de que Temer no Planalto, por ora, convém. Há até quem imagine em boa-fé que as ratas por ele cometidas até lá facilitarão a vitória de um candidato oposicionista. E, de supetão, ocorre-me perguntar aos meus desesperançados botões: haverá eleições em 2018?

Na edição da semana passada, Roberto Amaral, raro representante da inteligência resistente, formulava a mesma pergunta. E os botões, cabisbaixos, admitem: sim, faria sentido que não houvesse pleito em 2018.

Se chegamos aonde chegamos à custa de um golpe desfechado pelos próprios poderes da República, a usufruir da propaganda midiática e do apoio logístico da PF, por que quem rasgou a Constituição não sonharia em se manter onde está, se possível para todo o sempre?

Mesmo que Lula venha a ser condenado, a eleição é um risco que a casa-grande se habilitará a correr? Quem seria o candidato dos golpistas conciliados? Ainda que afastado da disputa, o ex-presidente não tem largas condições de ser um formidável cabo eleitoral?

E a sombra de Bolsonaro, ou de alguém da mesma estampa, não é assustadora o bastante? Não se iludam, soletram os botões, a casa-grande já se entregou faz tempo à elaboração de planos de escape, B, C, D, e quantos mais.

Há quem fale, para variar, em parlamentarismo. Qual? O mesmo que pretendeu limitar os poderes de Jango Goulart depois da renúncia de Jânio Quadros? Ou algo novo, parlamentarismo à francesa? Só falta gargalhar diante do disparate.

Algo é certo, no entanto, a inexorável aposta na ausência de reação popular. E aqui, neste ponto, os cidadãos conscientes e honrados não haverão de gargalhar.

O povo brasileiro é um dos mais oprimidos da Terra e, provavelmente, o mais resignado. De fato, faltou um partido de esquerda para levar os brasileiros condenados a um limbo de miséria e humilhação à consciência da cidadania. Como se verá pela pesquisa CUT/Vox Populi, publicada nesta edição, a despeito dos inquisidores curitibanos Lula continua a crescer.

Trata-se do único líder popular, mas é na figura carismática que a maioria pretende votar. Lula não é o PT.

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