terça-feira, 6 de dezembro de 2016

A sonegação que a mídia não denuncia

Por Joanne Mota, no site da CTB:

A cantilena que ouvimos desde que Michel Temer tomou de assalto o Palácio do Planalto, após o injusto julgamento da presidenta Dilma Rousseff com o impeachment sem crime, é que o Brasil está "quebrado", o déficit em 2016 será ainda maior do que o esperado e que, por isso, o país precisa de um remédio amargo.

Mas, esse remédio amargo será receitado para uma parcela da sociedade: ao conjunto da classe trabalhadora que foi incluída na última década. O tripé nocivo proposto por Temer e que põe em prática uma agenda ultraliberal prevê que seja cortado recursos da nossa ainda insuficiente Saúde e Educação, que os servidores públicos percam seu direito de ter seus salários reajustados e que o setor de infraestrutura pare.

O que esse tripé nocivo não cobra é a sonegação das grandes empresas, daqueles cerca de 5% mais ricos que lesam o erário nacional.

Em audiência pública realizada no último dia 28 de novembro pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, especialistas foram unânimes em condenar a opção pelo corte de investimentos - PEC 55 - como ferramenta para garantir o equilíbrio fiscal.

Durante a audiência, ao citar o rombo promovido pela sonegação fiscal, Henrique Freitas, do Sindifisco Nacional, lembrou que uma quantia equivalente a pelo menos 23% do Produto Interno Bruto — ou seja R$ 450 bilhões — deixam de ingressar nos cofres públicos todos os anos em decorrência da sonegação e da evasão fiscal.

Para efeito de comparação, déficit fiscal do governo para este ano é de R$ 170 bilhões, pouco mais de um terço do montante sonegado.

O pato que paga o pato

Informações publicadas no Portal Quanto Custa o Brasil mostram que o rombo é ainda maior. Até julho de 2015, 12.547 empresas brasileiras eram responsáveis por uma dívida tributária de R$723,38 bilhões. Levando em conta que o país possui cerca de 13 milhões de empresas registradas, menos de 0,1% delas responderiam por mais de 62% de todo estoque tributário da Dívida Ativa da União (DAU), que fechou o ano passado em R$1,162 trilhão (veja mais aqui).

Um observador menos atento, ou ingênuo, pode supor que os valores estratosféricos de créditos tributários inscritos na DAU, assim como a sonegação anual estimada em 10% do Produto Interno Bruto (PIB) que deve ultrapassar os R$ 500 bilhões em 2016, conforme indica o painel Sonegômetro, justificam-se pela autodefesa daqueles que dizem não aguentar mais pagar o pato.

É preciso tributar os ricos

Também presente na audiência, o pesquisador Rodrigo Orair, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), dois terços da renda dos milionários do Brasil são isentos de impostos, graças à isenção da retirada de lucros e dividendos feitas por proprietários ou sócios de empresas.

A tributação sobre o consumo - uma modalidade que não leva em conta a capacidade contributiva de quem paga, cobrando o mesmo valor de pobres e ricos - responde por 53% do que se arrecada no País, enquanto que a tributação do patrimônio representa apenas 4,2% do bolo tributário - ou apenas 2,6%, se se descontar o que é arrecadado com o IPVA.

Ou seja, que paga a conta são os mais pobres, a classe trabalhadora que é a que produz nossa riqueza.

Nunca é demais lembrar que o esquizofrênico desenho tributário não é um acidente de percurso, ele é fruto da chamada “reforma tributária silenciosa”. Uma iniciativa não publicada pela mídia no início do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) voltadas para a desoneração da renda dos mais ricos.

Além da isenção dos lucros e dividendos, também foi criado o abatimento dos juros sobre o capital próprio, o fim da punibilidade criminal para a sonegação em caso de “reconhecimento” da dívida — sem que necessariamente se precisasse pagá-la — e outras mudanças.

O que a PEC 55 esconde

Ou seja, o amargo remédio ofertado, pelo presidente sem voto, como saída para tirar o Brasil da crise, tem uma lógica tão simples quanto perversa:

1- aumentar impostos sobre o consumo, fazendo os pobres e a classe média gastarem mais e consumirem menos;

2 – subir a taxa de juros para controlar a inflação, multiplicando ainda mais o lucro de bancos e rentistas;

3 – cortar o orçamento de políticas públicas essenciais: saúde, educação, segurança, infraestrutura... A velha receita tecnocrata, sem o menor compromisso com o país e a parte da sociedade que mais precisa.

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