quarta-feira, 30 de junho de 2010

Plenária definirá lutas no pós-Confecom



Reproduzo artigo de Márcia Xavier, publicado no sítio Vermelho:

Para retomar a mobilização que marcou a 1a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada no final do ano passado em Brasília, entidades da sociedade civil realizarão, nesta quinta-feira (1o), na Câmara dos Deputados, o seminário "Pós-Confecom: uma contribuição ao debate sobre propostas e ações prioritárias". O objetivo é definir ações prioritárias e plano de ação na conjuntura posterior à Conferência Nacional de Comunicação.

O presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, Altamiro Borges, que participa do evento, destacou como principal desafio a retomada da mobilização, lembrando que “terminada a conferência houve letargia e dispersão e os ‘barões da mídia’, que boicotaram a conferência - das oito entidades patronais, seis abandonaram o evento -, não ficaram parados e estão fazendo carga pesada contra o governo.”

Ele citou o caso da instalação do Conselho Nacional de Comunicação, cujo decreto já estava pronto e que foi adiada para o próximo governo. Segundo Miro Borges, esse recuo é resultado da falta de pressão das entidades sociais. “Daí a importância dessa plenária de amanhã”, ressalta.

A ideia da atividade é reunir militantes das organizações da sociedade civil e movimentos sociais interessados em contribuir com o debate pós-Confecom para definir as propostas fundamentais entre as 633 aprovadas na Confecom que devem ser priorizadas. E definir linhas de atuação conjunta ainda para este ano.

Miro Borges adianta que entre os pontos prioritários já definidos nos debates realizados nos estados estão a melhoria e aprovação do Plano Nacional de Banda Larga, a instalação do Conselho Nacional de Comunicação e a regulamentações dos artigos da Constituição que se refere a comunicação.

Entre os artigos que devem ser regulamentados, Miro Borges faz referência a regulamentação das concessões de rádios e TVs. Ele diz que é preciso proibir o monopólio, que caracteriza a realidade atual no Brasil, onde meia dúzia de famílias detém a maioria dos veículos de comunicação. “Só se concede para quem já tem”, afirma, criticando ainda a falta de transparência no processo de concessões: “O cadastro não é público”.

No plano de ação, Miro Borges também já adianta o teor da discussão, dizendo que a ideia é fazer os movimentos sociais interferirem na campanha eleitoral, com definição das plataformas para o setor da comunicação e comprometimento dos candidatos com essas plataformas.

A entidade presidida por Miro Borges nasceu após a realização da Confecom, quando ficou clara a necessidade de construção de uma militância social, permanente e aguerrida nesta frente estratégica da batalha de idéias. Em parceria com muitas outras entidades já existentes, o Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé contribui na luta pela democratização dos meios de comunicação e pelo fortalecimento da mídia alternativa.

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A criminalização das rádios comunitárias

Reproduzo nota pública da Frente Paulista pelo Direito à Comunicação e a Liberdade de Expressão:


Nós, organizações integrantes da Frente paulista pelo Direito à Comunicação e a Liberdade de Expressão, manifestamos nosso repúdio a mais recente onda de criminalização e cerceamento da liberdade de expressão de inúmeras rádios comunitárias no estado de São Paulo. Nos últimos meses a repressão às emissoras, organizações, movimentos e ativistas que tem atuação na radiodifusão comunitária – segmento importante da luta pela democratização dos meios de comunicação – recrudesceu em nosso estado, com ações ilegais e ilegítimas realizadas pela Polícia Civil na região metropolitana de Campinas e Bauru.

O caso mais recente foi o fechamento da Rádio Nova Estação, em Campinas, que revelou a relação promíscua entre interesses privados e a atuação do poder público no campo da radiodifusão. Antes do fechamento da emissora, no dia 17 de junho, funcionários de uma empresa formada por ex-agentes da Anatel e que presta serviços de rastreamento e denúncia de rádios comunitárias às rádios comerciais visitaram a região. Na sequência, policiais da Delegacia de Investigações Gerais de Campinas, fortemente armados, lacraram a emissora e detiveram seis coordenadores regionais da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço). O carro de reportagem da TV Bandeirantes chegou ao local imediatamente depois para registrar a ocorrência.

Em 14 de junho, a Abraço já denunciara, em reunião do Conselho Consultivo da Anatel em Brasília, a atuação desta empresa privada, e solicitara a abertura de sindicância em São Paulo para apurar as possíveis relações entre ex e atuais funcionários da Anatel e as rádios comerciais. Houve ações de fechamento em que ex-funcionários da Anatel estavam identificados como atuais agentes do poder público.

A ação contra a Rádio Nova Estação traz novos indícios da relação entre empresários de comunicação – representados pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e pela Associação Brasileira de Radiodifusão (Abra) –, agentes da Anatel e a Polícia Civil de São Paulo, que sequer tem competência para atuar em casos de radiodifusão. Pela Constituição Federal, é prerrogativa da Polícia Federal, quando solicitada pela Anatel, auxiliar em ações de fechamento de emissoras que funcionem sem autorização.

O intuito da nova onda de fechamento de emissoras em São Paulo é criminalizar a luta pela democratização da comunicação e impedir o exercício do direito à livre manifestação do pensamento, criação, expressão e informação, assegurado constitucionalmente a todos e todas no Brasil. Contraditoriamente, prevaricando diante dos interesses das oligarquias políticas locais e regionais, a Anatel permite o funcionamento de rádios comerciais não regularizadas e que utilizam equipamento não certificado, tal como foi testemunhado nas ações de fiscalização na Rádio Morena, em Campinas.

Diante de tais acontecimentos, repudiamos fortemente a ação ilegal que levou ao fechamento dessas emissoras e pedimos que o Ministério Público Federal investigue a relação da referida empresa com as denúncias que pautam a ação da Anatel na região, assim como a participação da Polícia Civil de São Paulo nestas ocorrências. Convocamos ainda as entidades e movimentos integrantes da Frente Paulista para se somarem à Abraço num ato massivo, a ser realizado em Campinas, em defesa da liberdade de expressão e contra a criminalização dos movimentos sociais.

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Procura-se uma oposição séria

Reproduzo artigo de Eduardo Guimarães, publicado no blog Cidadania:

Em que pese ser arriscado cantar vitória antes do tempo, penso que a eleição de Dilma vai se tornando irreversível. E devo dizer que o fenômeno, por mais que decorra da satisfação do brasileiro com a forma como o país é administrado, pode ser debitado, em grande parte, a erros crassos e à mediocridade e à falta de seriedade da oposição midiática.

A começar pela escolha do candidato da oposição. É espantoso que PSDB, PFL e seu aparato midiático tenham confundido o recall (lembrança de um político pelo eleitorado) de Serra com força eleitoral do tucano.

Pesquise-se a blogosfera progressista e se encontrarão centenas de análises de que o que o tucano tinha não era nada mais do que confusão do eleitorado entre um nome conhecido (o de Serra) e o candidato que Lula apoiaria.

Contudo, os péssimos analistas políticos da oposição e da mídia simplesmente se negaram a enxergar o fato. Talvez por continuarem acreditando que se mantinha vigente o poder de persuasão que essa mídia deixou de ter após a catástrofe que foi o segundo governo FHC, devido ao eleitorado ter entendido que foi induzido ao erro de votar no tucano em 1998, pois a manutenção do real valorizado, que ele prometera, era uma farsa.

Outro erro da direita midiática foi abusar da invenção de escândalos para desmoralizar Dilma e Lula. Estão em curso estudos acadêmicos sobre o tsunami de escândalos inventados ou irracionalmente vitaminados que se abateu sobre o país a partir de 2005.

Outro grande erro da aliança entre a oposição e a mídia foi deixarem ver que um governo Serra poderia se constituir em uma verdadeira ditadura. Os setores verdadeiramente politizados da sociedade se assustaram com um governo que, como o de FHC, iria pairar acima do bem e do mal simplesmente porque, não tendo imprensa para fiscalizá-lo, poderia cometer atrocidades como as que cometeu o governo tucano entre 1995 e 2002.

Andei refletindo sobre o seguinte: por que um poder econômico tão gigantesco quanto esse que apóia Serra, dotado de toda a grande imprensa e dos mais poderosos grupos empresariais do país, não conseguiu um único analista que lhe dissesse para onde caminhava o projeto político conservador?

Não havia um analista que lhes dissesse que através da escandalização do nada não só não conseguiriam impedir que um governo tão popular fizesse seu sucessor como também estavam expondo que Serra era o candidato encarregado de manter a desigualdade no país?

Claro que havia. Não faltam analistas capacitados em uma coalizão política tão poderosa, do ponto de vista econômico e institucional. O que faltou foi coragem para contrariarem os caciques tucanos e pefelês, os barões da mídia, o mega empresariado e a elite branca em si.

É aquela velha história de monarcas enlouquecidos pelo poder absoluto trucidarem mensageiros portadores de más notícias. Foi medo dos analistas lúcidos de serem mal-interpretados pela elite midiática ao sugerirem comedimento na proteção da mídia a Serra e na difamação de Dilma e de Lula.

Os dois maiores atos irracionais em favor de Serra certamente serão estudados pela ciência social do futuro: a ficha policial falsificada de Dilma e a acusação a Lula de que teria sido um maníaco sexual que tentou estuprar um adolescente. Não me lembro de outro país em nosso estágio de importância e de desenvolvimento em que a oposição tenha tentado algo parecido.

Não sei até que ponto os agentes políticos já mensuraram, inclusive, o custo da campanha de difamação contra Lula e Dilma. Se calcularmos o custo do tempo de tevê e de rádio e dos espaços intermináveis na imprensa escrita que foram usados para atacar os petistas, chegaremos a cifras espantosas. Não me espantaria se chegassem aos bilhões de reais…

E o que mais impressiona é que não vejo o menor sinal de que os partidos e os meios de comunicação de direita estejam sequer cogitando interromperem a estratégia de desmoralizarem os adversários para se concentrarem em tentar oferecer alguma proposta ao eleitorado sobre o que Serra poderia fazer de realmente melhor.

A aposta tucano-midiática, ao menos até o dia da eleição em primeiro turno, não tenho dúvida de que será a de produzir mais do mesmo, ou seja, mais denúncias, mais pseudo escândalos, mas ridicularizações e desqualificações da candidata governista. E não haverá, nesse grupo político alucinado, quem tenha coragem de sugerir mudança de rota.

Aliás, penso que a estratégia permanecerá a mesma em um cada vez mais possível governo Dilma Rousseff.

Só que a incapacidade dos conservadores brasileiros de se reciclarem, ao contrário do que possam pensar seus adversários progressistas, é péssima para o país. A continuidade da escandalização do nada atrasa o desenvolvimento, atrasa projetos, políticas públicas, enfim, prejudica o desenvolvimento do Brasil.

Uma oposição propositiva, que fiscalize o que está errado, mas que não tente criar erros e escândalos inexistentes, faz falta a qualquer país. Uma imprensa séria, que fiscalize os políticos e governantes independentemente de ideologias e de colorações partidárias, faz mais falta ainda.

Quem nos garante que Dilma, por exemplo, não pode vir a ser uma péssima governante que iluda o povo com crescimento da economia herdado do governo anterior? Quem nos garante que ela não poderia deixar a corrupção campear, não se aliaria a grupos econômicos, enfim, que ela não fizesse o que fizeram um Collor ou um FHC?

Se isso ocorresse – e, vejam bem, não estou dizendo que ocorrerá, mas que tal possibilidade existe em qualquer governo –, quem poderia defender a sociedade e denunciar os malfeitos? Só a imprensa, é claro. Mas, então, não teríamos imprensa e oposição com credibilidade. Qualquer denúncia seria apontada como apenas mais um factóide difamatório da direita midiática.

O Brasil precisa de uma imprensa e de uma oposição sérias, mas não tem e não deverá ter por ainda muito tempo. A sociedade brasileira está dependendo de que tenha no poder bons governos como o de Lula. Se votarmos errado, como fizemos em São Paulo (na capital e no Estado), teremos que amargar governos ruins perpetuando-se no poder.

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Sem vice e sem discurso, Serra agoniza

O Portal Terra foi o primeiro a confirmar que José Serra está novamente sem vice na sua chapa. “Em reunião na casa do presidente nacional do PSDB, o senador Sérgio Guerra (PE), os tucanos resolveram desistir de colocar o senador Álvaro Dias (PR) como vice do candidato do partido à presidência, José Serra. Na madrugada desta quarta-feira, tucanos e democratas foram avisados por telefone pelo senador Osmar Dias (PDT) de que ele concorreria ao governo do Paraná, o que inviabiliza a defesa do nome de Álvaro para ocupar o posto”, revelou a jornalista Marcela Rocha.

Com mais esta trapalhada, prossegue a agonia da oposição neoliberal-conservadora. Qualquer que seja o vice escolhido nos próximos dias, o estrago já está feito. O clima entre os dois partidos da direita nativa é de desconfiança. No momento de tensão, o presidente do DEM, Rodrigo Maia, chegou a jogar a toalha. “A eleição nós já perdemos, não podemos perder é o caráter”. Venenoso, o senador Demóstenes Torres lembrou que “ninguém é obrigado a acompanhar o velório”.

Razões da crise demotucana

Anunciado como “mês da arrancada para a vitória”, junho confirma a infernal crise da oposição demotucana. Nem os programas gratuitos de rádio e TV do PSDB e do apêndice PPS serviram para impulsionar o candidato José Serra – este sim, um poste. As duas mais recentes pesquisas, inclusive do instituto tucano Ibope, mostram que Dilma Rousseff já está na dianteira. E não há nada que indique uma reversão desta tendência, a não ser o jogo sujo da direita e de sua mídia.

Serra não agoniza apenas em decorrência das dificuldades na escolha do seu vice – e mais de 20 nomes foram lembrados para ocupar o posto, sendo que a maioria preferiu evitar a aventura. Na verdade, o presidenciável tucano sofre da falta de discurso. Ele não tem vice e nem o que falar na campanha. Não dá para repetir os ataques ao “bolsa esmola” e à “gastança pública”, sob risco de apanhar em comícios pelo interior do país. Também não dá para criticar a política externa altiva do governo Lula, que é motivo de orgulho dos brasileiros segundo recentes pesquisas.

As dicas da mídia golpista

No terreno econômico, os índices recordes de geração de empregos e as previsões de que o PIB deverá crescer mais de 7% neste ano – já tendo sido batizado do Pibão – também deixam o fajuto “economista” sem discurso. Serra está num mato sem cachorro. No início, ele tentou se travestir de “continuador” do governo Lula e lançou o slogan “o Brasil pode mais”. A tática eleitoral não deu certo. Se for para continuar, melhor votar na candidata do presidente – concluiu o povo. Na sequência, ele tirou a pele de cordeiro e partiu para baixaria. Mas também não deu certo.

A mídia golpista, a única que ainda parece manter as esperanças na candidatura demotucana, já percebeu a arapuca. Em recente artigo, o Estadão alertou seu candidato. “Os temas econômicos, apesar de serem especialidades de Serra, como emprego e consumo, são francamente favoráveis à candidata governista. Será difícil o tucano encontrar um ‘gancho’ que lhe renda votos nessas áreas”. O jornal sugere que o presidenciável concentre sua artilharia na questão dos impostos – por mera coincidência, quase toda a mídia já está em guerra contra a carga tributária.

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Dunga e a arrogância histórica da Globo



Reproduzo excelente artigo do professor Venício Lima, publicado no sítio Carta Maior:

Embora tenha apoiado o golpe de 64, o regime militar e se consolidado como a mais poderosa rede de televisão do país durante a ditadura, houve períodos em que a percepção de boa parte da elite fardada era de que a Rede Globo de Televisão representava uma ameaça real de controle da opinião pública brasileira e precisava ser enfrentada.

No governo do General Geisel (1974-1979), sendo ministro das Comunicações o Coronel Euclides Quandt de Oliveira, foi certamente quando surgiram as maiores contradições e divergências entre o regime autoritário e a Globo. Documentos da época e sua análise estão disponíveis, por exemplo, no livro “Dossiê Geisel”, organizado por Celso Castro e Maria Celina Araújo e publicado pela FGV em 2002.

Encontro na UnB

Faço esta rápida introdução para relatar um encontro emblemático acontecido há 35 anos, entre professores do então Departamento de Comunicação da Universidade de Brasília e altos dirigentes globais, entre eles, Walter Clark (diretor geral), Luiz Eduardo Borgerth (diretor), Otto Lara Resende (assessor da presidência), infelizmente, já falecidos.

O contexto do encontro trazia, no mínimo, preocupações para as Organizações Globo:

1- A Globo havia perdido a disputa por um canal de TV aberta em João Pessoa, PB, por interferência direta do ministro Quandt que considerava um risco “aumentar o monopólio da emissora”.

2- O ministro vinha fazendo uma série de críticas públicas à televisão brasileira, todas de grande repercussão. Uma delas, a aula inaugural no curso de comunicação do CEUB, Centro de Ensino Unificado de Brasília, sobre “A televisão no Brasil” (17/2/1975). Na sua fala ele destacava os “perigos do monopólio” tanto de canais, quanto de audiência, quanto na programação “alienígena”.

3- Estava em andamento a criação da Radiobras [Lei n. 6301 de 15/12/1975] que era vista com desconfiança pela Globo pelo temor de que se transformasse em destinação preferencial de verbas publicitárias do governo.

4- Estava em discussão, dentro do governo, um pré-projeto de regulação da radiodifusão que deveria substituir o superado Código Brasileiro de Telecomunicações [Lei 4. 117/1962].

5- O Departamento de Comunicação da UnB era uma unidade acadêmica que produzia pesquisa crítica sobre a radiodifusão brasileira e acabara de elaborar um pioneiro projeto de unificação das televisões públicas que recebeu o nome de SINTIS, Sistema Nacional de Televisão de Interesse Social. Além disso, circulava que alguns de seus professores tinham acesso ao ministro das Comunicações e o abasteciam com dados nos quais ele fundamentava sua posição, direta e/ou indiretamente, contrária à hegemonia da Globo.

O objetivo do encontro, realizado por iniciativa da Globo, na UnB, era “trocar idéias” sobre as comunicações no Brasil. O que acabou acontecendo, todavia, foi quase um bate-boca.

Apesar da conjuntura politicamente adversa - para a Globo - em que se realizava o encontro, a memória de professores presentes é unânime em afirmar a arrogância de seus dirigentes. Não houve diálogo possível e cada um saiu do encontro ainda mais convicto em relação às respectivas posições. Divergimos em relação à existência de um virtual monopólio na TV brasileira; às finalidades educativas da televisão (previstas em lei); à prioridade ao conteúdo nacional e à necessidade de criação de uma rede pública de radiodifusão.

No presente como no passado

Relembro este encontro e a memória que dele ficou para reforçar os inúmeros comentários já escritos e publicados nesta Carta Maior sobre o enfretamento que a Globo faz a Dunga, aparentemente, por ele não ser conivente com os privilégios da emissora em relação aos demais veículos de mídia que estão cobrindo a Copa do Mundo na África do Sul.

Ao longo de sua existência, uma característica da Rede Globo tem sido ignorar que a televisão é apenas a concessão de um serviço público que tem como soberano o cidadão e seu interesse. Ao contrário, a Globo tem historicamente se comportado como proprietária das concessões de radiodifusão.

A própria Seleção Brasileira de Futebol constitui um patrimônio cultural do país que não pode ser apropriado por interesses privados. No entanto, o futebol brasileiro - não só a Seleção - tem sido explorado comercialmente pela Globo como se sua propriedade fosse.

A Globo, por óbvio, não tem mais em 2010 o poder que teve na década de 70 do século passado, enfrentado, por razões próprias, pelo regime militar. Mas conserva a arrogância.

Por outro lado, uma diferença do passado para o presente é que o inconformismo em relação à Globo não está mais restrito a alguns professores isolados em departamentos universitários. Repetindo a resistência que se expressou em outras situações históricas no lema popular “o povo não é bobo, abaixo a rede Globo”, a internet fornece hoje o suporte tecnológico necessário para que milhões de pessoas se mobilizem em torno de iniciativas como o “cala a boca Galvão” e o “cala a boca Tadeu”. Além disso, dezenas de blogs e sites alternativos tornaram pública a opinião daqueles que fazem contraponto à TV hegemônica.

Outro mundo possível

Resta manter a esperança de que - um dia - a transmissão de jogos dos campeonatos locais, regionais e nacional de futebol e a cobertura dos jogos da Seleção Brasileira, não serão exclusividade de concessionárias comerciais, mas estejam disponíveis nas redes públicas de televisão.

Em se tratando de um patrimônio cultural brasileiro, as redes comerciais privadas não deveriam remunerar as redes públicas para distribuir e comercializar este tipo de conteúdo?

O episódio Globo versus Dunga - que certamente ainda não terminou - deixa claro que já existe no país, não só uma ampla consciência da arrogância e dos privilégios históricos da Globo, como também novas e eficientes formas de expressar inconformismo diante dessa situação. E mais importante: novas e eficientes formas de apoiar aqueles que, como Dunga - correndo o risco de perder o emprego - não se curvam ao poder de concessionários de um serviço público que continuam a se comportar como se dele fossem proprietários.

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Um radialista na revolução de El Salvador

Reproduzo artigo de Nelson Rentería, publicado no sítio Opera Mundi:

"Radio Venceremos, transmitindo seu sinal de liberdade desde Morazán, pela conquista da democracia e da paz para El Salvador. Radio Venceremos, voz operária, camponesa e guerrilheira...". Por meio da voz e sem disparar uma única bala, Santiago obteve sua primeira vitória de guerra. Foi no momento em que ligou o transmissor da Radio Venceremos, emissora clandestina que animou a luta da hoje extinta guerrilha esquerdista da FMLN (Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional) durante 12 anos, até a assinatura dos Acordos de Paz de 1992.

A guerra civil salvadorenha (1980-1992) foi fomentada por uma série de atos repressivos praticada pelo governo salvadorenho e por grupos paramilitares. A violência atingiu seu ápice com o assassinato do arcebispo de San Salvador, Oscar Arnulfo Romero, por um comando ultradireitista na tarde de 24 de março de 1980. Dos altares, Romero defendia o diálogo de paz e denunciava a injustiça social, os altos níveis de pobreza e os crimes políticos atribuídos aos governos da época.

Dezoito anos depois, Santiago relembra, em seu confortável escritório em San Salvador, aqueles momentos de uma vida intensa na intempérie, em meio a combates e bombas, cheios de transmissões históricas e inúmeras anedotas ao lado de seus companheiros no estúdio instalado no subsolo da selva salvadorenha, no estado de Morazán – um dos territórios mais disputados durante a guerra civil.

O tempo tingiu de branco os cabelos e a barba desse jornalista sexagenário de origem venezuelana. O rosto demonstra cansaço, apesar da distância da intensidade do trabalho de radialista, mas ele garante que ainda presta serviços no "campo da comunicação".

Carlos Henríquez Consalvi nasceu em janeiro de 1947 no estado de Mérida, oeste da Venezuela. Conheceria o exílio ainda na primeira infância, já que seus pais eram opositores ferrenhos do presidente militar, o general Marcos Pérez Jiménez (1952-1958).

Diante das perseguições do regime venezuelano, seus pais, Rigoberto e Cristina, optaram por emigrar para o México e depois, Costa Rica. O destino desse homem viajante e revolucionário estava traçado desde seus primeiros dias de vida. Na década de 1970, ele voltou ao país natal e ingressou na Universidade Central da Venezuela para estudar jornalismo.

"Fomos uma geração que condenou os atentados à liberdade de expressão no continente em nossa época. Não podíamos expressar nossas ideias sem ter um chafarote [militar] ao nosso lado", contou Santiago ao Opera Mundi.

Mas a natureza lhe havia preparado um novo caminho. Em 1972, um terremoto sacudiu a Nicarágua e Carlos sentiu a necessidade de viajar ao empobrecido país centro-americano para registrar o fato. Embarcou em um avião da força militar venezuelana e chegou à Nicarágua. Depois da experiência no país, voltou a Caracas com o objetivo de concluir os estudos de jornalismo, mas seu espírito de viajante o levou a Buenos Aires, Argentina – onde, garante – foi motorista da cantora popular Mercedes Sosa e do fotógrafo de Jorge Luis Borges.

Santiago fez uma última parada de sua peregrinação na Europa, para depois se firmar na América Central, onde conduziu o projeto de uma rádio na costa atlântica depois da revolução sandinista de 1979, que derrubou o ditador Anastasio Somoza (1967-1979). Ele explicou que se interessou por El Salvador quando soube do assassinato do arcebispo Oscar Arnulfo Romero.

Radio Venceremos

Santiago contou que estava na Nicarágua quando membros da FMLN entraram em contato e o convidaram para liderar o projeto da Radio Venceremos. O venezuelano abandonou tudo e juntou-se à guerrilha salvadorenha em dezembro de 1980. Segundo o comando da FMLN, a rádio deveria estar no ar no dia 10 de janeiro de 1981, data em que a guerrilha lançaria a primeira ofensiva militar a fim de tomar o poder em El Salvador. Mas o dia se aproximava e a emissora não funcionava.

Correndo contra o tempo ao longo de vários dias de trabalho árduo, Santiago finalmente ativou "El Vikingo", como era chamado o radiotransmissor da marca Valiant Viking, adquirido a milhares de quilômetros dali, em um barco pesqueiro mexicano. "Foi um sucesso da equipe técnica, que fez funcionar a usina elétrica danificada", disse Santiago.

Segundo ele, a clandestina Radio Venceremos se transformou em referência noticiosa para as dezenas de agências internacionais que cobriam o conflito e em uma arma eficaz de propaganda. Era a voz da revolução salvadorenha. "As transmissões com mais calor, com mais emoção, aconteciam durante os bombardeios, especialmente porque driblávamos as operações militares. Nesses momentos, continuávamos transmitindo com mais adrenalina e paixão", contou.

Ante a incapacidade do exército salvadorenho de encontrar a cabine de transmissão subterrânea, surgiram vários mitos sobre a Venceremos. Alguns afirmando, por exemplo, que a rádio operava a partir da Nicarágua, governada pelos sandinistas.

Santiago se lembra de duas transmissões em especial: a primeira, assim que ativou o transmissor, e a última, realizada a partir do campanário da Catedral de San Salvador, depois da assinatura dos Acordos de Paz, em 16 de janeiro de 1992, pondo fim a 12 anos de conflito. Um relatório de 1993 da Comissão da Verdade de El Salvador disse que a guerra deixou 75 mil mortos – a maioria civis – e oito mil desaparecidos.

O projeto da Radio Venceremos naufragou depois dos acordos, em meio a divergências sobre o objetivo da emissora. "Havia duas visões contrárias, uma visão meramente mercantilista, que ao fim fracassou. Tiveram de fechar. E eu não quis participar de um projeto que não fosse um projeto sério de comunicação", explicou.

Pós-guerra

O Santiago antes barbado, descabelado e maltrapilho que sobrevivia sob a terra, em uma cabine de rádio, em nada se parece com o hoje elegante diretor do Museu da Palavra e Imagem (Mupi) de El Salvador, que em alguns momentos mostra-se receoso de lembrar o passado.

Ele abandonou a vida de viajante, se instalou em El Salvador em 1980 e se casou com a salvadorenha Georgina Hernández, com quem teve um filho, Camilo. "Dediquei-me a levantar a história dessas lutas sociais e me comprometi com o resgate da memória oral e das identidades culturais salvadorenhas", contou.

No Mupi, Santiago resgata a história ancestral e contemporânea do país. O museu guarda cerca de quatro mil vídeos da guerra, 50 mil fotos e todas as transmissões da rádio. Até desenhos animados são produzidos pela instituição.

O jornalista publicou os livros de memórias La terquedad del Izote (1992, México) e Luciérnagas en el Mozote (1996, El Salvador). Seu trabalho lhe rendeu em janeiro de 2009 o Prêmio Internacional de Cultura Príncipe Claus, da Holanda.

Ao contrário dos detratores da esquerda radical salvadorenha, Santiago vê com bons olhos o processo conduzido pelo governo da FMLN, com Mauricio Funes à frente, pois o considera uma das tantas vitórias da agremiação política, criada há três décadas. "É um processo muito interessante, muito complexo, mas que faz parte dessa construção coletiva que precisa seguir em frente, precisa continuar nos aperfeiçoando e avançar rumo às mudanças sociais pelas quais milhares e milhares pegaram em armas", afirmou.

Santiago prefere olhar para o futuro. Para ele, as lembranças dos dias na Radio Venceremos foram reduzidos a uma pequena exposição no museu, onde um aparelho de som recorda ininterruptamente uma de suas longínquas transmissões: "Radio Venceremos, transmitindo seu sinal de liberdade desde Morazán, pela conquista da democracia e da paz para El Salvador. Radio Venceremos, voz operária, camponesa e guerrilheira..."

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Um DNA dos jornais argentinos

Reproduzo artigo de Stella Calloni, publicado no jornal mexicano La Jornada:

Sob um clima de tensões e preocupações, começaram no dia 7 de junho, no Banco Nacional de Dados Genéticos (BNDG), as perícias para determinar se as duas crianças adotadas pela diretora do jornal e do Grupo Clarín, Ernestina Herrera de Noble, durante a última ditadura argentina (1976-1983), são filhos de desaparecidos políticos.

Depois de se esquivar de todo tipo de obstáculos impostos pelos advogados de Ernestina para impedir o exame, a Justiça argentina conseguiu se impor e fazer reunir dados genéticos importantes que podem determinar, em um lapso de 29 a 45 dias, se Felipe e Marcela Noble estão entre as 500 crianças roubadas pelos militares.

No BNDG, está guardada uma quantidade de mostras de DNA de familiares, recolhidas depois de um árduo trabalho das Avós da Praça de Maio, que procuram seus netos e denunciam há anos o plano sistemático utilizado pelos agentes da ditadura, que mantinham com vida as mulheres grávidas que sequestravam em operações de guerra suja e, depois que estas tinham seus filhos em condições atrozes, nos centros clandestinos de detenção ou hospitais das Forças Armadas, os arrancavam para entregá-los para a adoção.

Obstáculos

Mais de cem crianças foram encontradas, já jovens, em mãos de militares, policiais ou amigos destes. Há anos, Ernestina Herrera de Noble burla as disposições judiciais. Seus advogados pediram a recusa da juíza Sandra Arroyo Salgado, que ficou à frente da causa depois de ter ordenado o afastamento do magistrado anterior, Conrado Bergesio, que cometeu irregularidades para impedir os testes de DNA.

A Câmara Federal de San Martín estuda o assunto. A juíza não aceitou a recusa da família Noble e demonstrou que tem documentados todos os passos que deu, para impedir que se tente forçar seu afastamento do caso, como se fez até agora.

Tal medida já foi tomada em outros momentos. Vale lembrar o caso de Evelyn Vázquez – apropriada pelo militar da Marinha Policarpio Vázquez e sua esposa Ana Ferra –, que se negava a cumprir a lei que obriga a determinar a identidade nesses casos. Em fevereiro de 2008, a Justiça ordenou a polícia a entrar em sua residência para retirar material pessoal. O Banco de Dados confirmou, finalmente, que a jovem era filha de Susana Pegoraro e Rubén Bauer, desaparecidos durante a ditadura.

A vice-presidente da Avós da Praça de Maio, Rosa Roisinblit, lembrou que, “durante 20 anos, Evelyn disse que não queria prejudicar seu pai. Agora que se sabe quem são seus pais, vai se dar conta de que não o prejudicará, porque ele mesmo reconheceu o delito de apropriação”.

Abraço simbólico

Outros jovens filhos de desaparecidos que recuperaram sua identidade nos últimos dois anos denunciaram as ações do advogado dos Noble, que tenta pôr em dúvida o BNDG. Eles destacaram que, se alguém pode burlar a lei porque é poderoso economicamente, então tudo que se conseguiu até agora para se fazer justiça se perderá.

Centrais sindicais como a Central de Trabalhadores Argentinos (CTA) e outras organizações sociais deram, no mesmo dia 7, um abraço simbólico no Hospital Durand, onde fica o BNDG, para defender a lei em um tema tão sensível como o das crianças apropriadas e repartidas como botim de guerra.

No ato de abertura dos envelopes que guardavam as prendas dos filhos de Ernestina Herrera de Noble, estiveram presentes a juíza Sandra Arroyo, peritos, advogados das partes e o jornalista e advogado Pablo Llonto, denunciante nessa causa.

Escândalo

Enquanto isso, continua crescendo o escândalo pela forma com que os grupos de comunicação Clarín, La Nación e La Razón passaram a controlar a companhia Papel Prensa, produtora de papel de jornal, durante a ditadura. Ao testemunho da viúva de David Graiver – dono original da empresa, morto em um estranho acidente de aviação –, que relatou as terríveis torturas que ele sofreu durante o regime militar para que entregasse suas ações, se uniu a voz de Rafael Ianover, que foi vice-presidente da companhia entre 1973 e 1977.

Ele afirmou que, em agosto de 1976, ao regressar à sua casa, encontrou sua família sendo ameaçada por um grupo armado que havia revirado todo o local. A partir de então, começou um processo extorsivo e se chegou ao extremo de fazerem-no assinar um documento de venda sem se estabelecer preço ou condições.

“Assina que não vai te acontecer nada”, lhe disseram. Pouco tempo depois, Rafael foi preso. Tais testemunhos, assim como o do ex-diretor do diário La Opinión, Jacobo Timermman, que esteve sob torturas em um centro clandestino de detenção em La Plata, província de Buenos Aires, conformam os relatos mais terríveis sobre a cumplicidade de grupos econômicos e meios de comunicação com a ditadura.

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